Um dia sentar-me-ei tranquila
com as mãos repletas de letras.
Calma, sem crispações.
E as letras hão-de cair sobre o papel,
naturalmente.
E numa canção de roda,
algo infantil,
hão-de dar forma a tudo o que está ainda por arrumar.
"Não defendo nenhum dos meus indícios terrestres separadamente, como também não defendo nenhum dos meus versos nem das minhas horas isoladas: o importante é o conjunto. Não defendo sequer o conjunto dos meus indícios terrestres, defendo apenas o seu direito à existência, e à verdade - a minha." Marina Tsvietaieva
quinta-feira, 14 de agosto de 2008
sábado, 2 de agosto de 2008
sexta-feira, 1 de agosto de 2008
...in memoriam..
Rodin, A Catedral
Uma Espécie de Perda
Ingeborg Bachmann
Usámos a dois: estações do ano, livros e uma música.
As chaves, as taças de chá, o cesto do pão, lençóis de linho e uma cama.
Um enxoval de palavras, de gestos, trazidos, utilizados, gastos.
Cumprimos o regulamento de um prédio. Dissémos. Fizémos.
E estendemos sempre a mão.
Apaixonei-me por Invernos, por um septeto vienense e por Verões.
Por mapas, por um ninho de montanha, uma praia e uma cama.
Ritualizei datas, declarei promessas irrevogáveis,
idolatrei o indefinido e senti devoção perante um nada,
(- o jornal dobrado, a cinza fria, o papel com um apontamento)
sem temores religiosos, pois a igreja era esta cama.
De olhar o mar nasceu a minha pintura inesgotável.
Da varanda podia saudar os povos, meus vizinhos.
Ao fogo da lareira, em segurança, o meu cabelo tinha a sua cor mais intensa.
A campainha da porta era o alarme da minha alegria.
Não te perdi a ti,
perdi o mundo.
in O Tempo Aprazado
(tradução de Judite Berkemeier e João Barrento)
Usámos a dois: estações do ano, livros e uma música.
As chaves, as taças de chá, o cesto do pão, lençóis de linho e uma cama.
Um enxoval de palavras, de gestos, trazidos, utilizados, gastos.
Cumprimos o regulamento de um prédio. Dissémos. Fizémos.
E estendemos sempre a mão.
Apaixonei-me por Invernos, por um septeto vienense e por Verões.
Por mapas, por um ninho de montanha, uma praia e uma cama.
Ritualizei datas, declarei promessas irrevogáveis,
idolatrei o indefinido e senti devoção perante um nada,
(- o jornal dobrado, a cinza fria, o papel com um apontamento)
sem temores religiosos, pois a igreja era esta cama.
De olhar o mar nasceu a minha pintura inesgotável.
Da varanda podia saudar os povos, meus vizinhos.
Ao fogo da lareira, em segurança, o meu cabelo tinha a sua cor mais intensa.
A campainha da porta era o alarme da minha alegria.
Não te perdi a ti,
perdi o mundo.
in O Tempo Aprazado
(tradução de Judite Berkemeier e João Barrento)
Elos Sagrados ou A Interdependência de Todas as Coisas
Sempre que baixamos as defesas dos nossos egos – vontades, medos, certos “ideais”, gostos e desgostos, rotinas - a Vida entra por nós adentro, invade-nos, recria-nos, devolve-nos a nossa verdadeira dimensão.
Paradoxalmente (ou não) é na Dor e no desnorte que a Vida, sempre à espreita, encontra as brechas para chegar até nós. Quando, vencidos, nos deixamos ir.
Descobrimos então que cada momento, cada encontro, cada troca tem a sua razão de ser nesta coreografia imensa. Que um gesto aparentemente sem grande sentido “aqui” ganha uma força imensa “ali”. Que uma palavra, um livro, um acontecimento, um conhecimento que nos chegou por via de outrem num dia ou numa noite de meia-luz, e que não nos disse tudo o que tinha para dizer mas que guardámos, vai-se revelar de forma mais plena em outro lugar, em outro contexto, quando o soltamos.
E descobrimos que somos muito mais do que aquilo que cabe dentro da nossa própria pele. Descobrimos que para além de todas as experiências que nos habitam, somos também importantes elos de ligação entre todos os mundos por onde nos movemos, entre todos os seres com quem nos relacionamos e que essa condição de elo é, também ela, uma dimensão sagrada da Vida que existe em nós.
M
Paradoxalmente (ou não) é na Dor e no desnorte que a Vida, sempre à espreita, encontra as brechas para chegar até nós. Quando, vencidos, nos deixamos ir.
Descobrimos então que cada momento, cada encontro, cada troca tem a sua razão de ser nesta coreografia imensa. Que um gesto aparentemente sem grande sentido “aqui” ganha uma força imensa “ali”. Que uma palavra, um livro, um acontecimento, um conhecimento que nos chegou por via de outrem num dia ou numa noite de meia-luz, e que não nos disse tudo o que tinha para dizer mas que guardámos, vai-se revelar de forma mais plena em outro lugar, em outro contexto, quando o soltamos.
E descobrimos que somos muito mais do que aquilo que cabe dentro da nossa própria pele. Descobrimos que para além de todas as experiências que nos habitam, somos também importantes elos de ligação entre todos os mundos por onde nos movemos, entre todos os seres com quem nos relacionamos e que essa condição de elo é, também ela, uma dimensão sagrada da Vida que existe em nós.
M
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